Claudio Naranjo
Apresentação
Claudio Benjamín Naranjo Cohen
“Por que escrever a história da minha vida? E, por que esperar que alguém possa se interessar por ela? … então, canto a mim mesmo, em um espírito de celebração implícita, e com a esperança que minhas marcas possam ser uma inspiração para outros peregrinos.“
Claudio Naranjo
É com essa inspiração que faremos aqui uma apresentação de Claudio Naranjo que não se conforme apenas com dados curriculares de sua imensa trajetória cultural e acadêmica, informações, essas, que estão disponíveis em seu próprio site.
Assim, o que nos orienta é sua completa e profunda imersão na cultura, ou melhor, na contracultura, com sua colaboração nos movimento dos idos de 1960 que, como nos alertava Claudio: “as vezes se chamou de ‘Nova Era’, as vezes de uma ‘Revolução da Consciência’ ou mesmo ‘Contracultura’, e que se associou inicialmente com os beatnicks da California, logo com os hippies e, por ultimo se tornou um movimento de massa de uma extraordinária produtividade, do qual derivaram novas formas de psicoterapia e de busca espiritaul”, uma verdadeira epifania da experiência humana, momento decisivo para uma nova forma de ver e viver o mundo, que ao longo do tempo tornou-se para nós uma incansável busca para a sabedoria (σοφία Sophia).
Claudio nasceu em 24 de novembro de 1932 em Valparaíso, Chile e faleceu em 11 de julho de 2019 em Berkeley na sua casa na Califórnia. Músico de formação, iniciou desde muito cedo com o piano e estudou composição musical no Conservatório Nacional do Chile. Graduou-se em medicina em 1959 e fez sua residência médica em psiquiatria na Clínica Psiquiátrica Universitária da Universidade Nacional do Chile, sob a direção de Ignácio Matte-Blanco, submetenu-se a uma análise didática no Instituto Chileno para a Psicanálise.
Amante das artes e da música em especial, aproximou-se de filósofos, músicos, poetas, e, mas tardiamente, sábios, místicos e xamãs autocones de culturas originarias. Claudio nos conta do efervescente ambiente cultural que se respirava em sua casa, com a presença de figuras renomadas como o poeta Pablo Neruda, o pianista Claudio Arrau a quem Naranjo deve seu nome, e faz referências a outros personagens que chamaram sua atenção e lhe despertaram uma grande curiosidade e influências, como o poeta Davids Rosenman, o filósofo Bogumil Jasnowski.
Todavia, é um artista em especial, escultor, poeta e visionário chileno, Tótila Albert, uma espécie de benfeitor a quem Naranjo atribuía um dom profético, que vai inspirar sua proposta de uma revolução paradigmática, sintetizada no poema: o paradigma triunitário, baseada no amor da família sã e da família interior: o pai, a mãe e o filho, que consagra aos três amores, eros, ágape e philia, a via régia que sustentaria e orientaria sua trajetória para o desenvolvimento de uma nova era da consciência humana frente à nossa civilização patriarcal.
Em sua autobiografia, Claudio revela que a morte acidental do seu único filho, na véspera da Páscoa de 1970, pareceu colocar um ponto final em uma etapa da sua vida, e que a etapa seguinte começaria com uma peregrinação sob a direção de um mestre espiritual chamado Oscar Ichazo, que incluiu um período de isolamento no deserto próximo a Arica, ao norte do Chile, iniciando seu acesso à vida contemplativa ao sentir-se guiado a partir de dentro. Desde aí, atarvés de uma espécie de prestidigitação, sistematizando o que ficou conhecido como eneagrama da personalidade.
Autor de dezenas de livros, durante seus últimos anos escreveu e publicou algumas obras de grande originalidade que reúnem e integram várias saberes como a Hermenêutica Musical, Budismo Dionisíaco, Dramatis Personae, que nos brindam com uma generosa qualidade literária e de informações e experiências proprias que revelam sua maturidade psicoespiritual.
Cláudio é pioneiro na compreensão transpessoal da evolução humana e nos estudos e aplicação psicoterápica dos psicodélicos. Em 2014 foi convidado a abrir o Primeiro Congresso Internacional sobre a Ayahuasca, bebida xamânica sul-americana cujos efeitos foi o primeiro a investigar e aplicar na clínica, desenvolvendo pesquisas e sua aplicação em numerosos grupos de trabalho em diversos países. Ao publicar “El viaje sanador” e, posteriormente, “Ayahuasca, la enredadera del río celestial“, descreve e atualiza suas explorações terapêuticas dos anos de 1960, também com outras substância psicoativas, que estimulou convites para dar palestras e entrevistas sobre o tema, postergadas por decênios devido à sua intenção de ser escutado pelos educadores sem os ruídos das pesquisas psiquiátricas.
Todavia, é através do que chamou de competências existências, como o amor ao próximo, a atenção ao aqui-e-agora e ao desapego, ou as orientações de matriz dionisíacas que põe em evidência a liberdade, a espontaneidade e a sintonia com nossas tendências naturais e com a natureza mesma. E, o autoconhecimento, que como forma de amor a si mesmo tem alcançado seu maior desenvolvimento na mais moderna via de crescimento humano, a psicoterapia, em especial, a música interior como o ponto dessa inflexão paradigmática.
Pois, já sabemos desde tempos imemoriais que a música dos xamãs e curandeiros nas cerimônias de devoção e cura, ao se constituir como um via para a consciência plena, revela uma crucial inflexão para a espiritualidade desvelando sons que surgem das manifestação e das vibrações mais profundas da alma humana, sons que nos transportam aos nossos recantos mais íntimos e alhures, sons mântricos e da natureza cujas vibrações criadoras simbolizam a origem universal de todos as coisas e por isso as unem. Entretanto, afirma, que: “sabendo ou não, os músicos são mais que músicos”, pois se constituem sob uma influência espiritual para toda a humanidade, já que encarnam e revelam o espírito do amor universal, justamente, em suas três dimensões: eros, ágape e philia.
Dizia, portanto, Claudio, que Bach, Beethoven e Brahms correspondiam a uma suposta trindade mística, correspondentes ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo com expressões musicais sagradas do espírito humano.
Seja como for, a música enquanto ato poético expressa não apenas sons em frequências gramaticais, mas a poesia, a dança e a vida. Sua comunicação é através do tempo, o que faz com que todas as artes aspiram ser música, pois comunica o mundo e o amor universal.
Logo, seu aspecto terapêutico, desvela-se numa hermenêutica iluminativa, poética musical que corresponde às vivências com seu efeito sobre nossa vida emocional e espiritual e, que, produz um ato terapêutico, poético, poiésis, uma elevada manifestação da nossa consciência, revelação que se constitui naturalmente pela comunicação entre frequências, falas que congregam o conteúdo de suas expressões, portanto, expressam motivos em grande medida emocionais, que são micro significados que nos levam à presença de Deus ou da própria morte.
São essas vivências de uma fenomenologia das emoções que situam-se em correspondência direta com essas micro correlações de frequências dos intervalos entre notas musicail que sempre estão em relação com sua origem, ethos originário que promove uma harmonia que nos organiza em verdadeiras mandalas de cura e paz.
Podemos dizer, então, que seu legado pioneiro e desafiador contínua por meio de quem os recebeu e sabe realizar, um círculo esotérico de discípulos, e por vários institutos independentes espalhados pelo mundo, como a nossa proposta da Academia de Ciências e Artes Contemplativa, que nasce na velha catedral do SAT em Brasília, sob as bênçãos do próprio Claudio profetizadas muito antes de nos deixar, incentivando os idealizadores desse desafio, na companhia de antigos e originários colaboradores, mestres, bodhisattavas iluminados e avatares da consciência que, livremente, no interesse de um conhecimento transformador, ainda inspirados no propósito de transcender a mente patriarcal vigente, que parece agonizar nos estertores da nossa civilização patriarcal.
*Claudio tinha como expressão especial dessa música interior.
Retrospectiva de meu aprendizado e trabalho
“Aquele que sabe, e sabe que ele é: é sábio. Que ele seja seguido. Apenas pela presença dele o homem pode ser transformado”
Recital Sarmouni
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